Let it Be
Gravado entre 02 de janeiro e 31 de
janeiro de 1969.
Em Twickenham de 02 de
janeiro até 15 de janeiro 1969
Na Apple de 22 de janeiro até 31 de janeiro de
1969
Lançamento: 08 de maio de 1970
O
Let it Be tinha tudo para ser uma mega projeto. Um excelente material para os
fãs. A ideia inicial era filmar os Beatles compondo, ensaiando e no final
tocariam em algum lugar ao vivo. De ideia inicial tinham como local o
Roundhouse em Londres, até chegaram a reservar duas vezes. Ou então um
Anfiteatro Romano na Tunísia onde as filmagens começariam ao entardecer com a
arena vazia (praticamente a mesma ideia do Pink Floyd Live in Pompéia de 1972)
mas com um diferencial: depois, pessoas de todas as raças e credos entrariam
(em cena) para ver a maior banda do planeta ao vivo.
Filme
Inicialmente
o projeto teria o nome de Get Back. A volta as raízes, os rocks, os primórdios.
Porém o resultado final é bem diferente. O que se vê no filme, de fato é a
maior banda do planeta ensaiando, combinando arranjos, porém discutindo, se
desentendendo... É o mesmo que colocar uma câmera full time na residência de um
casal que está prestes a se separar. A tensão é a mesma.
Alguns
momentos de descontração podem ser vistos. Se vê Paul falante, animado, dando
tudo de si, George Harrison executando seus solos com sua Telecaster da Fender,
Ringo conduzindo as músicas, tocando piano, cantando, John Lennon em perfeita
sincronia em Two of Us, I´ve Got a Felling, Dig a Pony, o assistente Mal Evans
sempre de prontidão e Yoko Ono1, sempre sentada do lado de John.
As
filmagens iniciaram no estúdio Twickenham. Sem cenário, apenas os ensaios e a
gravação do disco seria documentado em vídeo. Filmar um making of de uma
gravação é um processo delicado. Além de delicado é extremamente tenso quando o
making of é de um disco de uma banda conhecida e amada no mundo todo, mas que
passam por um momento de cautela administrativa. Os negócios não iam bem, tudo
parece ter contribuído para deixar o clima para lá de pesado.
Como
qualquer bomba prestes a explodir, o previsto aconteceu. Depois de uma
discussão entre Paul e George, no dia seguinte uma discussão entre John e
George, na qual John chegou a criticar o talento de George como compositor.
George acaba saindo da banda. Aliás, um dia antes na discussão com Paul, George
já havia sugerido a separação da banda. No documentário Living in The Material
World sobre George com direção de Martin Scorcese, George diz que na noite
daquele dia de sua saída do estúdio ele compôs Wah Wah. Uma reunião foi feita na
casa de Ringo, onde as diferenças entre John e George ainda não se
solucionariam. Mais alguns dias, duas condições para George voltar seria que
não se realizasse a tal apresentação ao vivo e que mudassem de Twickenham para
o suposto estúdio de 72 canais que “Magic Alex” estaria construindo na sede da
Apple. O estúdio que o “Magic Alex” tinha construído era um horror. Para se ter
uma ideia, todo estúdio que se preza tem a sala técnica onde são capturados os
áudios de cada instrumento, microfone, tudo em uma mesa de som. Da sala técnica
para o estúdio, não havia uma passagem de cabo sequer. E olha que estamos
falando de 1969, muito distante da tecnologia wireless. Ou seja, foi preciso que
George Martin trouxesse dois gravadores da EMI, passassem os cabos pela porta
da sala técnica para que então os Beatles começassem a trabalhar novamente.
Durante
as filmagens, centenas de músicas foram ensaiadas. Muitas ficaram de fora e só
seriam conhecidas (pela discografia inicial) após os lançamentos do Anthology 3
e Let it Be Naked. Mas pelo mercado não oficial, os discos piratas ou bootlegs,
vários CDs já traziam esse material, alguns como uma qualidade de som inferior
aos oficiais, porém um presente e tanto para os fãs. Entre alguns lançamentos
vale a pena destacar o Black Album (que ao contrário do que se imagina, não se
trata de outtakes do White Album e sim dos outtakes do Let it Be), as coleções
Get Back Journals, Rockin Movie Stars, Day by Day (que é considerada por muitos
como tudo que foi gravado) e a Mega coleção do selo Purple Chick chamada A/B
Road, com seus 83 cds, ou uma versão mais condensada é a coleção Thirty Days
com 17 cds. Nessas coleções é possível ouvir as músicas ainda tomando forma,
John e Paul pegando nota por nota no violão as harmonias vocais de Don´t Let Me
Down, Two of Us, entre outras. Das canções que ficaram de fora podemos destacar
Child of Nature (que ficaria conhecida dois anos mais tarde como Jealous Guy no
disco Imagine de Lennon), Octopus Garden e Maxwell Silver Hammer que seriam
gravadas no Abbey Road, Junk que sairia no primeiro disco solo de Paul, All
Things Must Pass que faria parte do disco homônimo de George, e também Suzy
Parker, The House of Rising Sun do Animals, entre outras.
Billy
Preston foi convidado para tocar junto nas gravações do Let it Be. As gravações
fluíram, e o tal show aconteceu no telhado da Apple. O Rooftop Concert. Quem
passava por ali na hora do almoço, foi presenteado com a real última
apresentação ao vivo da maior banda do planeta. A cena do corre corre, pessoas
olhando para cima, garotas correndo, tiozinhos subindo no telhado dos outros
prédios para ver, carros que passavam pelo local buzinando, seria ali uma volta
da Beatlemania? Poxa, tinha tudo para tal. Muitos fãs de Roberto Carlos dizem
que o brasileiro tocou no telhado antes dos Beatles, no filme Ritmo de
Aventura, Roberto canta a canção Quando.
As
opiniões se dividem. Há quem goste de disco Let it Be como ficou, afinal, é um
disco dos Beatles, e afinal, em outros discos, em outras ocasiões foram usados
todos os tipos de orquestrações também. Há também quem crucifique sem dó Phil
Spector por ter defecado nas masters, por outro lado, há quem goste do trabalho
dele...
A
verdade é que Spector pegou as fitas masters e trabalhou ao seu jeito. O homem
“The Wall”, a parede sonora. Logicamente
quando se está acostumado com o trabalho de George Martin se estranha
totalmente a conduta de outro produtor. Ainda mais Spector que figura na lista
dos músicos e produtores problema da história do rock n roll. Spector certa vez
produzindo o End of Century em 1980, álbum dos Ramones, por algum motivo, Dee
Dee Ramone não queria gravar determinada parte de uma música. Spector com toda
a sua doçura e bom mocismo sacou um revólver que carregava consigo e encostou
no peito do baixista obrigando o a ficar e tocar exaustivamente até atingir a
perfeição.
Depois
do Let it Be Spector ainda trabalhou com George Harrison, John Lennon... No
documentário de Martin Scorcese sobre George “Living in Material World”,
Spector diz que George não era perfeccnionista, ele ia além disso.
A
primeira mixagem teria ficado por conta de Glyn Johns, até aí o projeto
chamaria Get Back. Uma das coisas que aconteceram foi que o disco “vazou” sem
mais nem menos. Nos dias de hoje, antes do lançamento estaria na internet para
todo mundo baixar, assim todo mundo teria quase que em tempo real. Mas em 1969
ainda era possível dar um jeito. No final das contas, o disco só foi lançado em
08 de maio de 1970 em uma edição luxuosa, que vinha em uma caixa de papelão que
trazia a capa do disco, o disco e um livro de foto das sessões de gravação.
Bom,
vamos ao Let it Be (o disco)
Lado
A
1. Two
of Us (Lennon / McCartney)
2. Dig a Pony (Lennon / McCartney)
3. Across
The Universe (Lennon / McCartney)
4. I
Me Mine (George Harrison)
5. Dig
It (Lennon / McCartney / Harrison / Starkey)
6. Let
it Be (Lennon / McCartney)
7. Maggie
Mae (trad. Arr. Lennon / McCartney / Harrison / Starkey)
Lado B
1. I´ve
Got a Feeling (Lennon / McCartney)
2. One
After 909 (Lennon / McCartney)
3. The
Long and Wind Road (Lennon / McCartney)
4. For
You Blue (George Harrison)
5. Get
Back (Lennon / McCartney)
Lado A
1. Two
of Us (Lennon / McCartney)
Uma
balada com a banda inteira, com violões perfeita harmonia entre Paul e John.
Paul a escreveu para sua esposa Linda Eastman. A letra fala exatamente o que
sugere o título “Nós Dois”. Fazendo tudo a dois, escrevendo cartas, cartões
postais, dirigindo sem destino... No filme ela tem um arranjo mais rock, aliás,
um dos poucos momentos de descontração entre John e Paul. Paul
quando canta “... You and
I have memories...” canta imitando Elvis Presley e John Lennon se abaixa
tocando guitarra acima do normal como se estivesse reverenciando Presley.
2. Dig
a Pony (Lennon / McCartney)
Canção
com um ótimo andamento, harmonia entre John e Paul, o solo de George está
impecável. Canção gravada no telhado da Apple.
3. Across
The Universe (Lennon / McCartney)
A
primeira versão porém é de 1968, gravação inclusive da qual participaram a
amiga brasileira Lizzie Bravo e Gayleen Pease. A versão aqui do Let it Be é
mixada. A música foi composta na época em que os Beatles estavam na Índia. O
próprio refrão já é um mantra.
4. I
Me Mine (George Harrison)
George em
sua música com harmonia junto com Paul. No filme enquanto George, Paul e Ringo
tocam, John dança com Yoko. A versão do disco é diferente da versão do filme.
5. Dig
It (Lennon / McCartney / Harrison / Starkey)
Canção
tocada com todo mundo junto, é de uma das sessões da Apple. No disco apenas uma
parte foi lançada. George Martin aparece tocando uma espécie de chocalho.
6. Let
it Be (Lennon / McCartney)
Muitos fãs
já pensaram que essa canção tem uma conotação religiosa em virtude das palavras
Mother Mary, mas na realidade tem a ver com a mãe de Paul falecida quando ele
ainda era pequeno.
O solo do
disco é diferente do solo do single.
7. Maggie
Mae (trad. Arr. Lennon / McCartney / Harrison / Starkey)
Música
tradicional folk da cidade de Liverpool que conta de uma prostituta que roubava
lojas.
Lado B
1. I´ve
Got a Feeling (Lennon / McCartney)
O riff da
guitarra abre o lado B do disco. Esta é uma das canções do famoso Rooftop
Concert, os Beatles tocando no telhado da Apple. As imagens se alternam entre
telhado e alvoroço causado na rua. Corre corre, gente por todos os lados,
muitas dessas pessoas sem imaginar que aquele era o último grande concerto da
super banda.
2. One
After 909 (Lennon / McCartney)
Trata-se de
uma das primeiras músicas da dupla Lennon e McCartney. Música que ficou
conhecida (oficialmente) no Anthology. Aqui ela está com um novo arranjo. E
George esmerilhando em sua Telecaster. A magia entre John e Paul, por mais que
estivesse em atritos, funcionava.
3. The
Long and Wind Road (Lennon / McCartney)
A música
mais mexida por Phil Spector. Colocou cordas onde não tinha, um coralzão de
fundo, praticamente anulou os instrumentos tocados pelos Beatles. No filme se
vê apenas os 4 Beatles e Billy Preston.
4. For
You Blue (George Harrison)
Canção de
George gravada das sessões da Apple. No filme é a cena em que todos os Beatles
chegam ao estúdio da Apple. As falas no meio da música dão a impressão de que
se trata realmente de um ensaio bem informal. Poxa, quem não gostaria de passar
um dia dentro do estúdio vendo os Beatles ensaiando, gravando? John Lennon
ataca com a slide guitar que mais tarde se tornaria uma das marcas registradas
de Harrison.
5. Get
Back (Lennon / McCartney)
Outra música
que tem uma atmosfera muito legal de ensaio. Geralmente quando ouvimos um
disco, ele foi editado, masterizado, ou remasterizado, etc. Get Back nos leva
para dentro do estúdio com os Beatles.
Considerações
Finais
O Let it Be
é o ultimo lançamento, foi gravado antes do Abbey Road. Ficou praticamente
engavetado por um ano, portanto é o último lançamento da discografia oficial dos
Beatles. O que foi lançado depois do Let it Be é compilação das gravações
existentes e material inédito também, como no Anthology, Live at BBC, até o Let
it Be Naked. Phil Spector? Existe quem odeie o resultado final, tem gente que
gosta e tem aqueles fãs que reagem com o comentário: Mas é um trabalho dos
Beatles! O disco soa realmente como um ensaio, um pouco de falatório no meio
das músicas. É passada a impressão de passar um dia com os Beatles num estúdio.
Qual fã não gostaria de passar algumas horas com os Beatles vendo os ensaiar,
gravar, conversar... Disco obrigatório para todo fã.
Esse texto já estava pronto desde 2014, quando existia um projeto de um blog só sobre Beatles em parceria com os amigos Robert Moura e Daniel Moreira, mas no fim das contas o blog não saiu. Ainda falando sobre o Let It Be, eu mesmo demorei um pouco a compreender um pouco o disco. Falando da capa, a capa que todo mundo conheceu foi a com moldura preta com quatro fotos uma de cada Beatle. Aqui no Brasil saiu aquela capa toda protegida por plástico (capa conhecida como capa sanduíche) e alguns anos mais tarde capa simples normal. Na inglaterra e alguns países saiu capa dupla .Eu particularmente ainda prefiro a capa que saiu com a mixagem do Glyn Johns, na sacada do prédio da EMI como a foto do Please Please Me de 1963.
O filme não foi remasterizado até hoje, é conhecida do grande público apenas a versão oficial do filme lançado em 1970. Mas também existem os outtakes desse filme num dvd triplo chamado The Beatles - The Get Back Chronicles 1969;
Puxa, Baratta, que texto bacana! Bem caprichado. Parabéns! Abraço.
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